A Universal Music Brasil acaba de disponibilizar a pré-venda da versão em vinil do antológico álbum “Gagabirô”, o décimo álbum do cantor e compositor mineiro João Bosco, lançado em 1984.
Um marco não só na carreira de João Bosco, mas também na música popular brasileira. Com “Gagabirô”, o bruxo mineiro começa a trilhar um caminho ainda mais original. Em três composições, criando sozinho, sem letristas, ele abraça a invenção de canções-solo em que o violão personalíssimo e a incrível capacidade vocal avançam soltos para expressar a negritude da alma brasileira. Como explicou o próprio João Bosco, à época do lançamento: “Gagabirô é o meu coração quando bate negro”.
A faixa 1, “Bate um Balaio ou Rockson do Pandeiro”, puxa filiação e homenageia o genial paraibano Jackson do Pandeiro (1919-1982), com explorações rítmicas à sua altura, em diálogo com César Camargo Mariano (em piano Yamaha e DX-7) e o baixo do gigante Nico Assumpção (1954-2001), destaque em outros momentos do disco. Na antológica faixa-título, João Bosco parte de um canto afrocubano de santería (wembá, dos abakuá, de matriz nigeriana iorubá) e incorpora os atabaques no violão e nas vocalizações originais. Em “Tambores”, acompanhado somente por Nico, ele traduz cha cha cha e “africaribe” num dialeto próprio e no violão percussivo.
Aplaudido com unanimidade pela crítica, “Gagabirô” também teve ótimas vendagens, impulsionadas por “Papel Marchê”, bolerão com versos de Capinan e grande contribuição do baixista Jamil Joanes na marcante introdução. Exposta na trilha da novela global “Corpo a Corpo”, de Gilberto Braga, a música foi uma das mais tocadas nas rádios do Brasil em 1985. E a porção mais inspirada da lira blanquiana surge em “Preta-Porter de Tafetá”, brincando com oxítonas em francês, português e tupi para envolver Villegaignon e Mitterrand no humor lúbrico carioca.
“Gagabirô” também é cultuado por uma ambiciosa canção que se desdobra em lindíssima peça sinfônica, “Senhoras do Amazonas”, com letra de Belchior (1946-2017) e arranjo de Radamés Gnatalli (1906-1988), o maestro que ajudou a formatar a MPB com um sarrafo de qualidade lá no alto.
No lado B, sambas com o genial parceiro Aldir Blanc (1946-2020) esquentam o clima. Com cuícas em brasa, “Jeitinho Brasileiro” celebra maneirismos de craques da avenida como Neguinho da Beija-Flor, Quinzinho, Jamelão e Carlinhos de Pilares. No encerramento, “Dois Mil e Índio” alopra no sincretismo de fantasias, com um pé no samba-funk. “Gagabirô” tem o melhor de dois mundos (múltiplos) de João Bosco.
Pedro Só
Fevereiro de 2025
Repertório “Gagabirô”:
Lado A
1. “Bate Um Balaio ou Rockson do Pandeiro” (João Bosco)
2. “Papel Marché” (João Bosco e Capinan)
3. “Preta-Porter de Tafetá” (João Bosco e Aldir Blanc)
4. “Imã dos Ais” (João Bosco e Capinan)
5. “Gagabirô” (João Bosco)
Lado B
1. “Jeitinho Brasileiro” (João Bosco e Aldir Blanc)
2. “Tambores” (João Bosco)
3. “Retorno de Jedai” (João Bosco e Aldir Blanc)
4. “Senhoras do Amazonas” (João Bosco e Belchior)
5. “Dois Mil e Índio” (João Bosco e Aldir Blanc)