Álbum de 1987, que traz delícias do casal como “Pega Rapaz” e “Bwana”, chega em LP laranja na UMusic Store
Por Guilherme Samora*
“Viva Brazix, do jeito que tá/ Pau-com-pedra pernas pro ar/ Dúvidas, dívidas ao Deus dará/ Darks ditaduras”. É com “Brasix Muamba”, esse petardo roqueiro sobre a falta de esperança com a realidade do país, que Rita e Roberto abrem “Flerte Fatal”. O disco de 1987, que inaugurou o contrato da dupla com a EMI, é relançado em vinil cor de laranja pela Universal Music no dia 13 de abril. O álbum estará disponível para a venda na UMusic Store, plataforma de e-commerce da companhia.
Depois do genial dark-deprê-cinematográfico “Rita e Roberto” (1985), o casal queria festa. E, mesmo com o peso da faixa de abertura, eles desfilaram delícias pop/rock pra ninguém botar defeito. “Flerte Fatal”, a música-título, mostra logo a que veio com versos sacanas e refrão em ritmo orgástico e com um jogo de palavras que só Rita poderia criar. “Um pecadinho escondidinho, rapidinho, gostosinho/ no banheiro social/ Impetuoso, indecoroso, mafioso/ atrás da árvore de Natal/ Um santo pecadinho original”.
“Bwana”, uma favorita dos fãs e que quase foi lançada no disco de 1985, se tornou um dos maiores hits do álbum, mantendo-se no topo das paradas de sucesso durante semanas. O refrão, com dobras vocais perfeitas de Rita, é uma delícia. “Adeus sarjeta/ Bwana me salvou/ Não quero gorjeta/ faço tudo por amor”. Virou clássico instantâneo. Por falar em vocais, Rita desfila no LP um de seus grandes registros na carreira. Despretensiosamente, brinca com agudos, médios e graves, com aquela voz que ninguém consegue emular.
Além de produtor do disco, Roberto faz vocais, toca guitarra e teclados. Entre os músicos, Moogie Canazio, engenheiro de gravação, é responsável pela bateria eletrônica em duas faixas; Lee Marcucci está no baixo e Athos Costa na bateria.
O LP traz também a gravação de Rita para “Me Recuso”, que ela havia composto para Gal Costa, em 1977, para o álbum “Caras e Bocas”. O lado A fecha com uma homenagem de Rita para Mary, sua irmã mais velha, com versão emocionante para a canção favorita dela, “Blue Moon”. Mary, a quem Rita conta ter incentivado seu interesse por música e cinema na infância, morrera sete anos antes, em 1980.
“Pega Rapaz”, não por acaso, foi escolhida para abrir o lado B. Uma das composições mais geniais de R&R, desde o início era a aposta da gravadora como o maior hit do disco. E foi o que aconteceu na época. A faixa traz Roberto nos teclados, acordeon e guitarra (com aquele solo incrível!). Fato digno de nota é que a canção vazou, como se diz hoje quando uma música é tornada pública antes da hora. Vale lembrar que o vazamento de “Pega Rapaz” foi em uma época pré-internet.
Acontece que uma rádio conseguiu uma fita com uma versão inacabada e a colocou no ar. As outras rádios, para não ficarem para trás, gravaram da programação da concorrente e também começaram a tocá-la. E foi um verdadeiro Deus nos acuda para tentar rastrear de onde surgiu a versão pirata e enviar uma versão com qualidade – e finalizada – da música. A TV Globo correu para fazer um videoclipe, com a participação especial de estrelas como Tonia Carrero, Raul Cortez e Antônio Pedro, e colocou no ar no Fantástico. E, claro, virou trilha sonora de novela (Brega & Chique, Globo, 1987).
Tanto buchicho acabou rendendo: o disco já saiu com 100 mil cópias vendidas e, em menos de dois meses, já batia as 250 mil. Rita e Roberto decidiram botar o pé na estrada com a Tour 87/ 88, tocando em estádios e ginásios de capitais de todo o Brasil. Além disso, o show também foi levado aos EUA, Portugal e França, terminando no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo. Com tamanho barulho, “Flerte Fatal” chegou a meados de 1988 com mais de meio milhão de discos vendidos.
Seguindo o lado B, “Músico Problema” trata das vaidades de um band leader. “Para com Isso” e “Picola Marina” (essa, uma joia de Roberto com Antonio Bivar, com vocal divertidíssimo de Rita) vêm em seguida. “Xuxuzinho”, inspirada em Xuxa, fecha o LP e foi o terceiro sucesso do álbum. A faixa conta com uma abertura impagável: uma reza de Gungun – personagem de Rita – pedindo a papai do céu um namorado.
Trinta e seis anos depois, o relançamento de “Flerte Fatal” joga luz em uma das grandes parcerias de Rita e Roberto. Descubra (ou redescubra) sem moderação. Volúpia!
*Guilherme Samora é jornalista, editor e estudioso do legado cultural de Rita Lee